Eu Recomendo #10 – Mangás de terror, suspense e horror!

A pedido do Dih e do Luk, hoje estou aqui para um “Eu Recomendo” especial de Halloween. Quem sou eu?

Eu me chamo Roberta, prazer! E hoje nos vamos pegar juntos o trem fantasma direto para o Jigoku (inferno). Sim, daqueles antigos e divertidamente toscos dos parques de diversões. Será que ainda existem?  

A emoção que sente ao ler um bom mangá de terror é a mesma que leva pessoas a frequentarem parques de diversões e subir em brinquedos horripilantes [nunca me esquecerei da minha primeira volta numa montanha russa com loopings e do quanto gritei até arrebentar os pulmões na primeira volta no kamikaze/ranger]. Os quadrinhos de terror, como bem disse a mangaká Kanako Inuki; “É uma forma de conseguir isso de uma maneira segura e controlada. O quadrinho de horror dá às pessoas o mesmo tipo de excitação mental em um ambiente igualmente controlado.” – Eu confesso que não me assusto com terror nenhum, mas me divirto e fico elétrica sempre que me deparo com algum que consiga provocar em mim puro nervosismo ou uma excitação crescente em minha mente.

Curiosamente, os mangás do gênero não fazem tanto sucesso no ocidente quanto os filmes japoneses de terror, mas felizmente temos uma diversidade enorme a um clique, nessa lista procurei diversificar bastante os títulos alternando entre mais fortes e leves, conhecidos e desconhecidos.  Nenhum dos mangás possuem litros de sangue respingando das páginas, embora não esteja totalmente ausente, é meramente um elemento secundário. 

Zekkyou Gakkyuu
(Screaming Lessons)

Autora: Emi Ishikawa

Ano: 2008

Volumes: 11 (em andamento)

Demográfico: Shoujo

Zekkyou Gakkyuu atualmente é um dos mangás de terror que mais me encantam. E não, não é assustador, os personagens são crianças e adolescentes na faixa dos 8 a 13 anos, com uma narrativa um tanto quanto infantil – Justificado pelo fato de ser publicado na revista Ribon para meninas entre 09 e 13 anos, da editora Shueisha. Mas, vale lembrar que infantil não é sinônimo de histórias ruins e descerebrais. A estrutura narrativa é a típica de histórias episódicas que envolvem o mundo sobrenatural. Para efeito de comparação se assemelha bastante a outro mangá voltado para meninas; Jigoku Shoujo. Aqui, o guia espiritual é uma garota misteriosa chamada Yomi, o fantasma de uma adolescente que perdeu parte do seu corpo abaixo da cintura. É ela que inicia e fecha as histórias, quase sempre com uma lição de moral acerca de valores familiares e sociais. Ô Japão!

Ishikawa faz um excelente trabalho ao concentrar seu terror na vida cotidiana de crianças, extraindo o melhor das características mais marcantes dessa idade, sempre com um toque sobrenatural e fantástico. A desobediência, o bullying, distúrbios alimentares, vingança, o egoísmo em não querer dividir seu brinquedo com os outros amigos, e até mesmo uma simples cabulada de aula, já são motivos para uma punição às vezes bem dolorosa. Tá, nem sempre ocorre uma punição, mas há sempre a moral no final da história, com Yomi alertando as pequenas leitoras do perigo de seguirem por um caminho semelhante do desfecho da história.

Digno de nota o fato de Ishikawa nunca se acovardar, não atenuando os efeito de uma ação equivocada por parte de seus personagens. Alguns recebem um destino trágico e tocante, há capítulos que chegam a serem extremamente melancólicos, outros que possuem um grau elevado de violência. A arte é bem cutesy, ou seja, bonitinha, com traços arredondados, efeitos visuais típicos de um mangá shoujo de romance, mas o tom obscuro é bem aparente. Sempre que Ishikawa quer atingir o ponto mais fraco de uma criança, ela contrasta a arte de uma forma altamente provocante. Em um dos capítulos, onde uma boneca ganhou vida ao ser alimentada pela comida que a garotinha jogava fora, e começou a se mexer, eu fiquei chocada com os movimentos, a obscuridade e os sons que ela emitia: “nhec nhec nhec”. Credo! Tenho pavor de bonecas. 

Ibitsu

Autor: Ryou Haruka

Ano: 2009/2010

Volumes: 02 (Já finalizado)

Demográfico: Seinen 

A história de Ibitsu (torção/torcida, em Japonês) é inspirada em uma lenda urbana japonesa, sobre o espírito de uma garota que constantemente assombra banheiros públicos e escolares, sempre perguntando “Gostaria de papel vermelho ou papel azul?” – Mas não importa qual seja a resposta, seu destino será trágico, meu amigo! Ibitsu pega essa lenda e cria uma variação, “a Lolita estranha”. Se no meio da noite você se encontrar com uma garota suja vestida de Lolita, e ela te perguntar “Você tem uma irmã?” e você cair na besteira de responder, a garota simplesmente vira um piolho, querendo ser a sua irmãzinha mais nova a qualquer custo. 

É a velha formula de sempre, da stalker perseguidora, que torturará sua vítima, física ou psicologicamente, até que este pire por completo. É divertido, tem alguns momentos de pura tensão e adrenalina. Há reviravoltas no enredo, mindfucks, tudo muito clichê, mas muito bem desenvolvido, inclusive nem chega a ser tão obvio a princípio. A Lolita é uma psicopata doente, mas você vai adorar vê-la torturar lenta, e dolorosamente suas vítimas. Sim, não apenas fisicamente, mas psicologicamente. Por isso ela é foda, só matar não tem graça, tem que fazer a garota fazer xixi na calcinha de medo, e o garoto entrar em estado psicótico – Isso realmente acontece na história, ela se diverte com a dor dos personagens! A arte do Ryou Haruka é simples, mas eficaz, além de bem peculiar. Não há tanta violência gráfica, mas o pouco que aparece, pela forma que Ryo desenha, faz os nervos ficarem a flor da pele. Eu ficava tensa com aquela garota andando sorrateiramente pelo teto! LOL 

Particularmente eu acho um pouco fraco, as histórias extras me pareceram mais charmosas quando você pensa em algo que te dê calafrios. Mas, é extremamente indicado principalmente pra quem não tem tanto costume com histórias de terror, e ainda assim querem sentir aquela gotinha gelada percorrendo pelas costas. Se gostar de Ibitsu, leia também Zashiki Onna, aquilo é bizarro.

Collapse Of The World As We Know it

Autor: Dashu Jiang

Ano: 2010

Volumes: 01 (em andamento)

Demográfico: Seinen 

Sem dúvidas, essa será a coisa mais estranha que você terá lido em um bom tempo. E eu não estou exagerando. Primeiro me deixe dizer que se trata de um manhua, vulgo histórias em quadrinhos produzidas na China. É diferente de manhwa [quadrinhos coreanos]. O sentido de leitura é ocidental, o traço dos chinocas e coreias são sempre detalhados, eles possuem uma boa técnica, mas só agora que seus quadrinhos vêm se popularizando mais. Os poucos que ganhavam traduções chamavam a atenção pelo traço, mas o roteiro quase sempre era decepcionante, certo?

Atualmente temos um bom número de quadrinhos feito pelos amarelos que não são japoneses, só esperando serem garimpados. Alguns destes são realmente bons. É o caso de Collapse Of The World As We Know it, uma coleção de contos assombrosos e bizarríssimos de Dashu Jiang. A estrutura narrativa dessas histórias se assemelha bastante aos contos dos Irmãos Grimm, só que sem a costumeira moral no final. É uma visão doentiamente distorcida. Repleta de negatividade. Assemelham-se a contos infantis, só que obscuras. Algumas histórias são tristes, outras simplesmente hilárias, repletas de humor negro. Há referências a nomes consagrados do horror japonês, como Shintaro Kago e Jinji Ito, com histórias inspiradas em seus contos. Também há uma boa dose de crítica social.

Essa série lembra bastante o gênero ero-gore pelo teor de bizarrices gráficas, o autor foi bem perspicaz ao conseguir traçar esse paralelo, sem precisar cruzar a linha. Indicado para quem prefere um terror menos sobrenatural, sem fantasmas, e mais bizarro, mais trash, envolvendo seres humanos. E este aqui se equilibra bem entre o feeling de terror e o horror gráfico. Afinal…. “Descasque os elementos sobrenaturais, e o que resta? Pessoas! Isso afirma o que eu sempre acreditei. Que nada é mais assustador do que pessoas.” – Kazuo Umezu. Se curtir Collapse Of The World As We Know it, experimente também Franken Fran.

Fuan no Tane

Autor: Masaaki Nakayama

Ano: 2004

Volumes: 02 (Já finaizado)

Demográfico: Shounen

Fuan no Tane, assim como em sua tradução literal [Sementes do Desconforto], é um mangá de terror bem peculiar, foge um pouco da estrutura convencional, com histórias curtas que possuem no máximo umas 5 páginas. Cada capítulo começa e termina antes mesmo que você perceba. É como estar andando no trem fantasma, saber que em algum momento vai aparecer algo que pretende te assustar, mas não saber calcular ao certo em que momento isso irá ocorrer, e então acabar soltando um grito, nem que seja por impulso. É algo parecido com você estar assistindo atenciosamente um filme de terror [daqueles assustadores], e alguém chegar por trás e tocar você. Você irá reagir toscamente e a outra pessoa irá rir da sua cara feia.

Consegue ser menos assustador que Zekkyou Gakkyuu, então se você tá querendo sentir um friozinho na espinha, esqueça este aqui. Nesta coleção de contos curtíssimos, mas interligado por um tema único, Masaaki Nakayama faz um jogo interessante entre mangaká e leitor. Um jogo que você só irá entender se aceitar entrar na brincadeira. Aqui, ele brinca com as convenções do terror, te fazendo questionar o que seria exatamente terror, através de recriações de lendas urbanas que povoam o imaginário coletivo japonês. A característica mais marcante sem dúvida é a forte pressão atmosférica em cada capítulo. Ideal para quem tem medo de histórias de terror, e borra os fundilhos com Fatal Frame. Se você tem medo. Se assusta facilmente. Possui uma imaginação fértil. Então leia Fuan no Tane e grave para mim as suas reações, eu vou me divertir bastante.

Digo novamente que, a ideia de Fuan no Tane é brincar com seus conceitos, e Masaaki Nakayama é um motherfucker desgraçado porque ele conseguiu brincar e manipular a minha mente. Você olha para o lado e não vê nada, no entanto, quanto mais você pensa naquilo que te dá medo, mais e mais uma sombra vai se formando no canto do seu olho e então; BUUUHAHAHAHAHAHAHAHAHA otário. Se você sobreviver, leia também Fuan no Tane Plus. 

The Drifting Classroom
(Hyouryuu Kyoushitsu)

Autor: Kazuo Umezu

Ano: 1972

Volumes: 11 (Já finalizado)

Demográfico: Shounen

Este é um dos maiores clássicos dos mangás, concebido pelo mestre do terror Kazuo Umezu. Mas eu fiquei um pouco reticente na última hora, sobre manter ou não este título entre as indicações. É de 1972, é outra escola de quadrinhos de terror, e embora tenha influenciado a maioria que se seguiu depois, é bem datado para os padrões atuais – Principalmente quando se fala de terror. Porém, ainda que o traço de Umezu não seja muito atrativo, e já ultrapassado, a dinâmica de arte sequêncial que ele imprime a cada página não envelheceu nem um pouco. 

The Drifting Classroom conta a história absurda onde uma escola é simplesmente arrastada inteirinha para um mundo completamente diferente do que eles conhecem. Um mundo de pesadelos tomado por uma atmosfera toxica e delirante. Os alunos quando olham pelas janelas da escola, só vem um deserto sem fim e aterrador. Essa série não é apenas uma história de terror, mas também de aventura assombrosa, com os personagens tendo que confrontar seus piores pesadelos. É uma história violenta, de professores que se matam mutualmente, e de alunos que precisam aprender a se virar sozinhos. E são apenas crianças! Nesta série, Umezu extrai o melhor do survivor horror: A pressão psicológica, que chega a níveis enlouquecedores e com uma tensão que deixará com os nervos a flor da pele. 

Ouch! E não é isso que é terror? Sentir o sangue correndo nas veias. Adrenalina. Tensão. Umezu coloca em The Drifting Classroom todos os seus medos e receios de quando era criança, onde é praticamente impossível você não se colocar no papel de alguns dos personagens. É uma espiral de insanidade que vai crescendo até atingir o clímax total, onde você, que acompanhou todas as situações mais surreais e dramáticas por todos esses capítulos, terá verdadeiros orgasmos mentais e visuais. O que torna The Drifting Classroom um autêntico representante dos quadrinhos de terror, não são o horror visceral, mas o absurdo de situações implacáveis e a imersão daqueles personagens na história de terror ao qual foram inseridos e a forma como reagem àquilo. Há uma cena onde o protagonista precisa ser operado por outra criança, sem anestesia. Você acompanha tudo aquilo com os dentes cerrados e os nervos a flor da pele, ao visualizar a tensão da outra criança de 11 anos, que precisa rasgar seu colega com um bisturi. 

HAHAHAHAHA É TENSÃO ABSOLUTA E NERVOS A FLOR DA PELE! Uma aula de suspense e terror psicológico. Um clássico.

Uzumaki

Autor: Junji Ito

Ano: 1997

Volumes: 02 (Já finalizado)

Demográfico: Seinen

Pareço meio suspeita em falar de qualquer obra do Junji Ito, meu mangaká de terror favorito, e um dos que mais gosto em termos gerais. Ele foi inspirado por Kazuo Umezu, o que se nota facilmente, por exemplo, no absurdo do argumento de Uzumaki. Uma cidade tomada por espirais? Hein? MÃS é sua paixão pelos Mythos – aqueles bichões com tentáculos que habitam o universo e já dizimaram o planeta terra incontáveis vezes – de H. P. Lovecraft, que tornam suas histórias ainda mais surreais que as de Umezu. Ele aplica em suas histórias, o conceito de mal absoluto, sem origem definida, sem fim, sem nenhum motivo aparente. Apenas é. E quando acontece, não adianta fugir. É tudo desesperançoso, caótico, tóxico, alucinógeno e… Deliciosamente trágico. 

Uzumaki – A Espiral do Horror foi lançado aqui no Brail pela falecida [para os mangás] editora Conrad. A qualidade é… Não, não é tão boa se comparado com outros lançamentos do gênero pela Conrad, mesmo tendo páginas coloridas, rs. Mas, eu devorei cada página como se estivesse comendo um delicioso pedaço de pudim. Essa leitura foi praticamente uma masturbação. Uma ode de prazer. Foi tão intenso que o mangá se partiu no meio. Sério. A lombada não resistiu. Acredito que poucos ainda não tenham ouvido falar de Uzumaki. 

Você não conhece? POXA, em que mundo você vive? É o mangá de terror mais comentado da interwebzzzz, e não apenas na esfera otaku, mas em toda a bolha nerd ocidental. Agora, apesar de todo esse apelo, Uzumaki não vendeu quando foi lançado, uma pena. Vou contar pra vocês como eu conheci Uzumaki. Eu estava num chat, na comunidade [do Okurt] de HOTD ao qual eu era ativa, e alguém puxou o assunto “mangás de terror”. O ano era 200…hmm….2010. Me disseram que Uzumaki era simplesmente o mangá mais assustador já feito. Cética que sou, foi procurar imagens aleatórias no Google. Quando eu vi aquelas imagens em forma de espiral, eu fiquei completamente em transe. “Eu preciso ler isso. TIPO agora” – Pensei.   

Uzumaki é a história sobre os moradores de uma pequena cidade, que do nada começaram a apresentar um estranho comportamento ao desenvolverem uma obsessão doentia por qualquer objeto ou animal que tivesse a forma de espiral. O horror que o Junji Ito coloca aqui, é quase orgânico, é como se tudo ali fosse palpável ao ganharem formas abstratas e disformes. Há um capítulo, onde a cicatriz na testa de uma garota ganha forma de espiral e aos poucos, vai lhe devorando, lhe correndo por dentro. É angustiante, é aterrador, é ridicularmente absurdo, é envolvente. É Junji Ito. 

A arte é a melhor que você encontrará em qualquer mangá de terror. É bem redondinho, traçado tipicamente shoujo – eu sempre digo isso, e não custa repetir, no Japão o público consumidor de mangás de terror, em sua maioria, são mulheres, e a própria origem do gênero é nos quadrinhos para garotas –, mas totalmente obscurecido. A tensão psicológica é intensa, e a forma como o enredo progride em Uzumaki, muitas vezes se revela chocante. 

Pra finalizar, fica a dica de The Enigma of Amigara Fault, eleita pela revista Super Interessante à história de capítulo único mais assustadora do mundo. Sim, é uma oneshot. E dá um sentimento forte de claustrofobia em quem ler. Não faz parte de Uzumaki.

por Roberta Caroline
(a.k.a. Beta Blood, dona e redatora do Elfen Lied Brasil)

Dih

Criador do Chuva de Nanquim. Paulista, 31 anos, editor de mangás e comics no Brasil e fora dele também. Designer gráfico e apaixonado por futebol e NBA.