Cantinho do Adra – Discutindo o ‘Efeito Kuzu no Honkai’

Nunca escrevi um post tão controverso antes.

Kuzu no Honkai é originalmente um mangá publicado na Big Gangan, tendo como autora Mego Yokoyari e com previsão de encerramento para março de 2017. Ele ganhou uma adaptação para anime na temporada de janeiro de 2017, contendo 12 episódios e sendo produzido pelo estúdio Lerche.

Lembro-me de quando começaram a comentar sobre esse mangá na minha roda de amigos, ainda em 2016. Todos tinham a mesma reação ao se revoltarem pelos acontecimentos da história. Ainda assim continuavam a ler. Não tive interesse no momento pelo fato de preferir animes – um defeito grave que tenho. Enfim, a obra acabou ganhando uma animação e foi a minha chance de entender o porquê de toda a revolta entorno da obra. Três episódios e meio depois, pude compreender perfeitamente.

Vejam bem: em resumo, o anime retrata as conturbadas experiências de alguns adolescentes e jovens adultos no que tange a relacionamentos com outras pessoas. Cada personagem ali gosta de alguém e esse alguém acaba por não nutrir do mesmo sentimento. É o famoso gênero Netorare, ou como gosto de chamar, NTR, apesar de ser uma variação do conceito original vindo dos hentais.

Esse gênero é famoso por provocar no expectador os mais diversos sentimentos, e a autora de Kuzu no Honkai não escolheu esse foco narrativo sem um bom motivo. O principal objetivo dela na obra é provocar quem está acompanhando a história. Ela bolou diversas formas de mexer com o interior do expectador, incomodá-lo, irritá-lo, deixá-lo desconfortável. Esse tipo de contato com quem está consumindo a obra não é algo novo – um exemplo de outro anime que tem a mesma tendência é Re:Zero, no qual a grande maioria de quem assistia odiava o protagonista Subaru, razão pela qual o autor fazia de propósito, pois desejava que todos sentissem pelo rapaz igualitária emoção que ele nutria sobre si mesmo.

Entretanto, Kuzu no Honkai faz diferente. Ele deseja que você odeie todos os personagens, que questione o porquê deles agirem de forma tão egoísta e ao mesmo tempo anseia para que a maioria deles quebre a cara na esperança de entenderem que estão se auto destruindo. São várias e várias cenas seguidas dos jovens se afundando nos próprios sentimentos, e você apenas observando, não podendo ir lá e pedir para que acabem com a tortura emocional. Diferente de Re:Zero, no qual nunca odiei o Subaru, pois sabia que ele escondia algo por trás de toda aquela cara heroica, aqui as situações no qual os personagens se sujeitam me enfurece genuinamente.

Foi então que comecei a me perguntar a razão para esse rebuliço de sentimentos.

O primeiro fator é, como já disse acima, o fato da autora desde o início ter o objetivo de mexer com o expectador. Ela sabe que você vai se enfurecer e por isso mesmo, continua a brincar com seus sentimentos, como uma das personagens do anime, a Akane-sensei, tanto se orgulha de incitar. O segundo fator é que toda a situação proposta pela autora é apenas uma escolha dos personagens, pois eles têm a opção de ir para vários caminhos menos masoquistas que o escolhido, têm ciência de que estão fazendo mal para si mesmos, mas continuam. É totalmente diferente do que ocorre em Re:Zero, onde o Subaru é pego em algo muito maior do que sua mente e visão podem enxergar, sendo arrastado pela tempestade de acontecimentos até alguém lhe jogar uma corda e dar um suporte.

Ou seja, temos uma obra propicia a pôr personagens na lama e, de fato, personagens que querem ficar na lama! Para não bastar, a autora ainda cria situações que, se você já passou pela adolescência ou está vivendo atualmente nela, pode acabar se identificando de alguma forma.

Eu passei parte do ensino fundamental e todo o ensino médio gostando de uma garota. Depois de um bom tempo, chegou ao ponto de ela parecer querer corresponder meus sentimentos, mas eu não tomei uma atitude e obviamente ela se cansou. Logo, vi ela nos braços de outro garoto. Sim, essa é uma história simples, algo que pode acontecer com todo mundo. Aquelas situações que criam um “e se” na sua mente por vários meses ou anos imaginando se tivesse tomado outra atitude, no que teria resultado. No meu caso, demorei superar essa derrota pessoal, entretanto, os personagens de Kuzu no Honkai escolhem a resposta mais tendenciosa ao sofrimento possível. Isso me afetou diretamente. Ver o modo como lidam com o amor, por saber como é não ser correspondido e ver eles seguirem um caminho onde essa dor só iria se intensificar.

É como se a autora tivesse olhado todos os casos de adolescentes apaixonados e não correspondidos e elaborasse um cenário onde todos saíssem machucados. Ela sabe que você provavelmente passou por isso, sabe que você vai odiar alguns ou todos, e ela deseja isso! Que você odeie tudo, o egoísmo, a imaturidade, os erros. Quer atiçar um possível passado na vida do leitor se aproveitando de um tema que é comum ocorrer em qualquer adolescente. É sádico, talvez até genial, mas causa um efeito de modo que não me faz querer continuar assistindo, mas esbofetear cada um deles. Chega a ser controverso, talvez, por isso apelidei de Efeito Kuzu no Honkai. É um drama tão legitimamente adolescente que me afasta, por ser raso, simples, vergonhoso, provocativo, como a maioria dos dramas nessa idade são.

Nunca pensei que as maiores qualidades de uma obra seriam justamente os motivos para eu deixar de conferi-la. De fato, o Efeito Kuzu no Honkai merece ser discutido.

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