Uma breve dissertação sobre a série mais comentada de 2013.
Se você frequenta o Chuva de Nanquim ou qualquer outro site e/ou blog do nicho acho que se você não viver em uma realidade alternativa ou não estiver morando em Marte no último ano, você provavelmente já ouviu falar de Shingeki no Kyojin, ou Attack on Titan.
Estamos falando da série que provavelmente é o maior fenômeno nos últimos anos e que em 2013 está tendo seu ano chave. E veja bem, não estamos falando no que diz respeito a qualidade de animação, história ou mesmo do traço do mangaká – até porque isso seria uma questão muito subjetiva e para alguns Shingeki no Kyojin passa longe de ser uma série favorita. Mas não há como negar o que se observa a qualquer lugar ou ponto que se frequente. E não estamos falando apenas da internet com sua média absurda de espectadores no MyAnimeList ou nos mangás mais lidos em sites de leitores on-line. Estamos falando na capacidade dessa série ao alcançar outros nichos, de instigar a curiosidade de pessoas que nem sequer acompanhavam um anime desde Yu Yu Hakusho ou Cavaleiros do Zodíaco na Manchete, de pessoas que nem ao menos sabem o que realmente é um “anime”. Você já deve ter se deparado com um amigo de sua escola comentando com outro no intervalo depois de assistir um episódio da semana, não é?
Fenômeno muito semelhante aconteceu em 2012 com o amado e odiado Sword Art Online, mas em uma escala muito menor. Provavelmente porque o público que era muito grande até metade da série acabou se dividindo entre os que amam e os que não amam na segunda metade – que de fato é a mais fraca e que ocasionou a queda brusca nas opiniões populares. Shingeki no Kyojin tem seu anime se encaminhando para seus últimos episódios e continua na boca das pessoas. Não é a toa que a editora Panini em uma atitude muito inteligente, avançou as negociações com a Kodansha e aproveitará o “hype” da série ainda nesse ano. O mesmo aconteceu em outros países.
Hoje Shingeki no Kyojin está constantemente na lista dos mais procurados da Amazon no Japão (seu volume 11 chegou a estar na frente de One Piece na pré-venda do site) e na versão americana do site constantemente se encontra entre os mais desejados. No Book Depository a situação se repete, fazendo com que o mangá esteja na lista dos mais encomendados e até com o esgotamento de algumas edições antes da Kodansha US anunciar a nova tiragem do mangá. Kodansha US que por sinal se mostrou extremamente no timing ao divulgar que lançaria novos volumes todos os meses, com lançamento digital e com edições em simultâneo com o Japão em novos volumes (provavelmente no volume 12 em diante isso já estará acontecendo). Isso sem falar em todos os outros países que já estão publicando o mangá, como os mercados consolidados de França, Alemanha, Itália e Espanha.
O anime – a principal arma de Shingeki no Kyojin desse ano – também se mostrou perfeito em sua função. Além de alavancar em mais de 100% a venda do mangá (que já era enorme) e mantê-lo em um recorde de semanas consecutivas no ranking da Oricon de mais vendidos, também conseguiu se tornar o anime televisivo mais vendido do ano na soma de DVD e BD. Não é de se estranhar que em breve a série seja anunciada para comercialização nos Estados Unidos também, e não digo o mesmo do Brasil, pois apesar dos eternos sonhadores nós sabemos que a realidade de animes em home vídeo por aqui está morta, até que alguma empresa inovadora e inteligente o suficiente prove o contrário.
Mas afinal, o que faz Shingeki no Kyojin um sucesso?
Eu realmente não quero me aprofundar em um texto explicando o que acho da história de Shingeki no Kyojin em si. Guardo isso para um futuro review. Mas no momento não se pode comentar da série sem dizer porque o sucesso dela explodiu entre “a massa”. Um texto do site americano The Hooded Utilitarian que compara a série com o recém sucesso de Pacific Rim (que aliás, recomendo a leitura desse ótimo artigo) diz muito sobre isso.
“In the world of Attack on Titan, people are sometimes good, but just as often they are weak or venal. Additionally – and this can’t be said enough – the world is a cruel place. However, the cruelty of the world is no reason to stop fighting – if anything, it’s a reason to keep fighting.”
Attack on Titan nos apresenta uma sociedade que é mais do que um bando de garotos com poderes especiais. São pessoas, vivendo uma realidade alternativa, mas que possuem ferramentas e critérios de batalha como qualquer outra poderia ter. Talvez essa identificação do público em reconhecer seus medos, pessoas que vivem suas vidas recheadas de mistérios e de “gigantes” para confrontar seja um dos pontos que faz a série se tornar tão “humana”. Talvez não. Talvez grande parte das pessoas que acompanham a série a vejam apenas como um lar de ação, de sangue, de batalhas épicas. Por que não? Afinal é entretenimento, não é?
Mas não é errado dizer também que existe uma mensagem por trás de toda obra. Com Shingeki não podemos dizer algo diferente. Sinceramente não me recordo agora onde, mas em um blog japonês o renomado autor Haruki Murakami havia dado uma entrevista dizendo que entendia o sucesso da série. Para ele Shingeki era o retrato de uma população japonesa que está tentando se redescobrir. De jovens que ainda não sabem ao certo o que enfrentam, o que estão se tornando. E se traçarmos algumas paralelas tudo faz bastante sentido. Basta lembrar que muitos jovens ao entrarem para a Guarda na série possuem diferentes ambições. Alguns apenas querem viver uma vida tranquila e acabam se deparando com as dificuldades. Outros vão de cara e dispostos a viverem o terror que a vida os espera. São inúmeras possibilidades. É como a vida real.
Mas independente desses paralelos, Shingeki no Kyojin consegue mexer com os sentimentos de seus espectadores. Alguns mais e outros menos. Não é de se surpreender ao ver alguém comentando como se sentiu emocionado ou chocado ao assistir um novo episódio ou ler um novo capítulo do mangá. Não é de se surpreender também em constantemente a ideia da tensão, das reviravoltas causadas pelo autor serem digeridas de diferentes formas pelos leitores. Alguns com olhares de repreensão. Outros com suspeitas do rumo da história. Outros com medo pelos seus personagens favoritos. Outros apenas com altas expectativas.
A intensidade – e insanidade – dos fatos, o desespero daqueles envolvidos na trama. Você não sabe quem vive e quem morre. Mesmo que alguns segredos sejam óbvios (olhos de titãs…) isso não diminui a forma como os acontecimentos são jogados em sua cara de supetão, de modo que você não entenda o que está acontecendo e se sinta ainda mais impotente, irritado e ansioso esperando o que vem a seguir. É esse medo humano, essa incerteza da vitória ou da derrota, que faz Shingeki no Kyojin mais “impactante” do que parece. É o tipo de coisa que tira suas esperanças, esmaga aquele pingo de certeza sobre qualquer acontecimento. É o homem perdendo, se dando mal e mesmo assim insistindo. Porque é assim que vivemos, e aqueles que não o fazem… Bem, não possuem lá dos melhores resultados.
O fato é que 2013 é o ano de Shingeki no Kyojin. Seja como a série mais comentada, como o mangá mais vendido, com o anime mais popular. A temporada de outubro ainda não chegou e pode ser que algumas séries consigam vender mais discos que os gigantes. Quem sabe? Mas a movimentação que Attack on Titan conseguiu dificilmente será alcançada por mais alguma série nesse ano. Mesmo aqueles que se distanciam e que não gostaram do que viram (e que estão em todo direito, afinal o popular também precisa ter sua opinião contrária) não pode negar tudo que vem girando ao seu redor em 2013 – e veja bem, mais uma vez não estou botando em cheque a qualidade do roteiro, história ou whatever; mesmo porque ele possui furos e coisas estranhas como qualquer battle shounen que “se preze”.
A intensidade de uma série há muito tempo não se via dessa maneira. A velocidade da popularidade da mesma também não. Em uma era em que a internet vem se tornando cada vez mais comum é provável que em algum tempo tenhamos outro furor com alguma outra série. Mas nesse exato momento, os gigantes estão na boca do povo – e ainda possui um live action pronto para sair, que hoje não seria loucura dizer que provavelmente terá um lançamento não será só restrito ao Japão.
Shingeki no Kyojin pode não ser o melhor anime do ano. Mas, de longe, com certeza o ano é de Shingeki no Kyojin.