A invasão do K-Pop na cultura japonesa

Mostrando que os coreanos também estão ganhando seu espaço na cultura pop japonesa.

Quem me acompanha no twitter ou em minha vida “pública” da internet, sabe que sou um grande fã de um dos gêneros que mais toma conta da internet hoje em dia: o K-Pop. Mesmo ainda se tratando de um estilo musical que não é do agrado de grande parte dos brasileiros, o K-Pop é aquilo que chamamos de “chiclete” e que infesta as mentes assim como aconteciam anos atrás com os famosos grupos pops americanos – eu por sinal, sou fã até hoje de artistas do gênero como Justin Timberlake, por exemplo.

Há algum tempo já tinha intenção de fazer um post explicando um pouco desse fenômeno que se espalhou nos últimos anos, mas ainda não havia conseguido a oportunidade correta. Hoje resolvi tirar as palavras dos cadernos e com a ajuda do meu amigo Lelo lá do Velvet Blog, mostrar um pouquinho desse movimento pop que toma conta e que faz multidões vibrarem em shows magnificamente bem organizados. Não sou um cara que sabe tudo sobre história e muito menos toda a repercussão do K-Pop no mundo, mas tentarei em algumas palavras lhes oferecer um pouco desse universo.

Mesmo que não goste de K-Pop, vale a pena a leitura. É sempre bom e interessante saber mais sobre a cultura oriental que não se resume só ao Japão. Espero que possam tirar um bom proveito daqui por diante.

Um pouquinho de história

“Hallyu”. Quem já ouviu falar nesse termo? Esse é o nome dado a chamada “invasão coreana” ao mundo dos japoneses. Na verdade, invasão essa que vem sendo sentida com mais força nos últimos 5 anos no país. Veja no gráfico abaixo, por exemplo, os índices de uma pesquisa feita com 12,085 pessoas em 2011 pelo site VisitKorea.

Na verdade, Coréia e Japão sempre tiveram divergências políticas e econômicas, passando até por fases bastante discutidas na história como o tratado de anexação do Japão e Coréia, no qual os japoneses eram os legítimos colonizadores dos coreanos. Com isso, os japoneses acabaram adquirindo durante muito tempo um certo “censo de superioridade” sobre os coreanos, o que dificultava muito a entrada da cultura de um país no outro. Em 1950, a Coréia começou sua luta pelo poder próprio e depois de uma guerra violenta, as duas se separaram entre Coréia do Norte – a comunista e que ostenta uma política de ditadura até hoje – e a Coréia do Sul – a capitalista e de tradições e costumes praticamente contrários ao da sua “irmã”.

A Coréia do Sul cresceu e se tornou forte em vários aspectos, entre eles tecnológicos e  de maiores infraestruturas do mundo. Hoje ela é considerada o décimo terceiro país com maior economia, um marco elogiável para um país de menos de um século de idade.

Nas últimas duas décadas, no entanto, a Coréia começou a exportar algo que chamou a atenção de outros países asiáticos e até mesmo ocidental nos últimos anos. É a chamada “cultura pop”, que desde meados dos anos 90 acabou se tornando muito influente no país devido ao seu forte investimento nos jovens e naquele que se tornou seu principal referencial no mundo jovem hoje: a música.

Para quem pensa que a Coréia é uma simples “cópia” do gênero pop americano dos anos 90 com Backstreet Boys, Spice Girls e outros, pode tirando seu cavalinho da chuva. A Coréia fez um trabalho de aperfeiçoar esse gênero e criou aquilo que chamamos hoje de “K-Pop”. Nele, jovens são treinados e supervisionados por grandes agências de entretenimento que chegam a investir cerca de 400 mil dólares na formação de canto, dança, aparência e shows de seus garotos e garotas, os tornando verdadeiras máquinas para o sucesso.

O sucesso foi tanto que o K-Pop recentemente invadiu os Estados Unidos, formando um grande cerco dos empresários americanos em busca de trazerem os fantásticos asiáticos para a legião de fãs que se formou no país.

Mas com certeza um dos grandes impactos que se formou foi a invasão da cultura pop no Japão. Por ser algo de forte influência jovem, as músicas de ritmo pegajoso e com o aperitivo de garotos e garotas bonitos e bonitas para o marketing, acabou sendo facilmente aceita por grande parte dos garotos japoneses. Isso acabou deixando os mais conservadores incomodados – mesmo os países lutando para diminuir essa divergência com eventos como a Copa do Mundo de 2002. A presença coreana já era grande com novelas e artistas vindo para o país e ocupando espaços em suas televisões e tornava a situação ainda mais desagradável para os mesmos. Isso sem falar no grande número de artistas que vinham da Coréia e ocupavam espaço de japoneses em diversas áreas – entre elas a de cantores.

Podemos resumir grande parte do conservadorismo japonês sendo contra a onda “Hallyu” e contra grande parte das agências que produzem os artistas da mesma – principalmente por algumas dessas agências já terem se instalado no Japão e conseguido empresariar artistas japoneses através delas. Porém engana-se quem pensa que o efeito contrário, de um japonês fazer sucesso na Coréia, seja fácil. Existe uma resistência muito grande dos coreanos em deixar algo assim acontecer, principalmente por status do passado e seu orgulho de já terem sido dominados pelo Japão um dia. Algo que chega a beirar o medo, é como podemos definir.

A ajuda das redes sociais e de sites como o YouTube foi essencial para a proliferação de tal “febre”. Diversos videos de artistas coreanos acabavam subindo rapidamente aos mais vistos do país e ajudavam a cada instante para o crescimento e popularidade dos mesmos. Artistas como BoA, Se7en e muitos outros, foram essenciais para essa inserção coreana no Japão.

A partir daí, tivemos os surgimentos das boy/girlbands que se tornaram instantaneamente o alvo do público japonês – e posteriormente do mundo inteiro – como Super Junior, BIG BANG, Girls Generation e tantas outras que hoje tornaram-se indispensáveis nas paradas musicais concorrendo diretamente com artistas japoneses, que viram em grupos como KAT-TUN, Arashi e AKB48 a disputa entre Japão e Coréia tornar-se ainda mais presente na vida dos jovens. Ao menos, é uma disputa sadia, onde só saem ganhando os próprios fãs.

O K-Pop e os animes

Podemos dizer que seria o caminho natural as indústrias de animes tentarem atrair o público utilizando de cantores coreanos em suas produções. E da mesma forma que os animes são uma ótima forma de divulgação para as agências e seus “astros”. Foi assim que com o passar dos anos os artistas acabaram conseguindo seu espaço nas aberturas e encerramentos de obras de sucesso e que muitos brasileiros não fazem a menor ideia de que na verdade não se tratam de japoneses.

O primeiro contato de muitos brasileiros com o K-Pop aconteceu em meados dos anos 2000 com o surgimento do anime InuYasha no antigo Toonami do Cartoon Network (e posteriormente na rede Globo). Na verdade, poucos tem conhecimento de que naquele anime já existia uma cantora K-Pop muito conhecida na época. BoA já era uma artista de sucesso da agência coreana SM Entertainment e foi levada ao Japão pela poderosa Avex Trax – e posteriormente tendo uma sólida carreira em estado americano também. Alguns podem “torcer o nariz” e dizer “Mas ela é diferente! Ela não é K-Pop!” – Uma pena dizer isso meu amigo, pois BoA é uma das cantoras com carreiras mais vitoriosas na Coréia, sendo chamada de “A rainha do K-Pop” na Ásia. No Brasil, seu trabalho ficou conhecido graças a música Every Heart do já citado anime InuYasha.

Podemos dizer que BoA foi a responsável – em partes – por esse pontapé do K-Pop nos animes. Estourou paradas da Oricon e conseguiu se destacar onde, até então, nenhum outro artista coreano havia conseguido chegar.

Outros artistas importantes começaram a avançar em direção ao Japão, até que uma delas chegou e abocanhou o anime de um dos animes parte da antiga tríade de poderosos da Shonen Jump: Bleach. Younha chegou ao Japão como apenas uma promessa, e depois de ter uma das suas músicas escolhidas como tema de um dorama, teve sua canção “Houki Boshi” no segundo encerramento do anime de Bleach. Foi o suficiente para fazê-la estourar nas paradas da Oricon e retornar vitoriosa para a Coréia, conseguindo manter seu sucesso nos dois países. Ainda cantou músicas para os animes de Kiba, Jyu Oh Sei  e Rideback. Por sinal, Houki Boshi até hoje é meu encerramento favorito da série, mesmo eu não sabendo do fato dela ser coreana na época.

Da mesma forma que Younha, dois outros artistas coreanos conseguiram conquistar seu público no Japão no primeiro momento para depois partirem para a Coréia. O primeiro foi JUNE, cantor responsável pelo segundo encerramento do anime de D.Gray-Man chamado de Pride of Tomorrow e também pelo nono encerramento de Bleach, chamado de Baby It’s You – o qual o forte era uma leve baladinha romântica.

Na sua sequência veio ainda a cantora da abertura do anime Romeu & Juliet, Lena Park, que conquistou o Japão e a Coréia com sua voz magnífica cantando a música You Raise Me Up. Confiram a voz da cantora clicando AQUI e não vão se arrepender, tenho certeza. Lena Park ainda conseguiu participação em vários shows de uma das integrantes da girlband mais famosa da Coréia, Jessica do Girls’ Generation.

Mas foram nos últimos anos – junto com a explosão Hallyu – que o Japão realmente levou grupos importantes para suas animações. Em 2011, três boybands coreanas importantes conseguiram se destacar na terra do sol nascente com animes de alto escalão. A primeira foi o 2PM, que contagiou a todos com seu dançante e contagiante encerramento de Ao no Exorcist. Take off foi feita com exclusividade para o público japonês e foi a porta de entrada para a boyband que já era um sucesso na Coréia, embarcar no Japão. Realmente viciante, daqueles ritmos que não saem da sua cabeça nem tão cedo.

Logo em seguida, tivemos ainda a participação de mais duas bandas em dois outros importantes animes recentes e também saltando das páginas da Shonen Jump. Beelzebub, que ganhou a viciante música Baby U do grupo MBLAQ – que esteve no Brasil em 2011 para ser jurados de um concurso de K-Pop nacional – em sua quarta abertura do anime (Clique AQUI para ver o videoclipe).  Mas foi Toriko que ganhou um destaque maior por contar com o primeiro encerramento de um dos grandes sucessos coreanos atualmente no Japão: F.T.Island. A banda que ao lado de outra boyband chamada C.N.Blue, conquistou o Japão pelo seu jeito diferente de K-Pop levado pela gravadora Warner Music Japan, no qual o ritmo leve e letras calmas, foram o ponto forte para encantar os japoneses e fazer com que as duas bandas fizessem um grande sucesso por lá – alguns dizem que até mais que na Coréia. A música Satisfaction foi a escolhida para o anime.

“Mas espera Dih, você tá esquecendo uma, não está?”

Sim, e foi proposital. Tinha que deixar essa para último pois ela é uma das bandas mais aclamadas no Japão mesmo com suas “indas e vindas”. Estamos falando de DBSK, também conhecidos como TVXQ ou Tohoshinki. Essa é uma das boybands mais famosas da Coréia e também trabalha sobre o selo S.M. Entertainment e Avex (os mesmos de BoA). Mesmo assim, a banda conseguiu conquistar ainda mais os japoneses ao fazer parte de duas aberturas de uma das séries mais adoradas por eles. Sim, estamos falando de One Piece! O DBSK foi o responsável por uma versão “remake” de We Are, a música símbolo da série. Mas foi com Share The World que conquistaram ainda mais seu público, conseguindo colocar muito carisma em uma das mais adoradas aberturas do anime.

Opinião e um pouco sobre o sucesso K-Pop

Alguns de vocês devem estar se perguntando porque eu não coloquei os videos das aberturas dos animes ao invés dos PV’s (Promotional Videos) oficiais. A resposta é simples. Além do não-risco do vídeo ser excluído (afinal grande maioria são de canais oficiais das empresas), queria mostrar para muitos que muitas vezes julgamos um grupo pela aparência pelo simples fato de algumas vezes encontrarmos coisas assim aqui no Brasil.

No caso do K-Pop, a forma como as bandas são vendidas tem muito a ver com suas aparências, sendo uma das grandes preocupações dos investidores. Não adianta julgar o K-Pop como um todo somente por uma foto que você viu de um grupo “colorido” e não gostou. A música coreana possui tantas “vertentes” como o chamado J-Pop, o problema é que na mente de muitos, a música coreana ficou taxada como “garotos que dançam músicas sem camisa”.

Como puderam ver nos videos dos animes, o K-Pop possui músicas “lentas” como JUNE, possui bandas “indies” como o F.T.Island e possui aquelas que chamamos de “chicletes”, como o 2PM. E existem muitos outros tipos, que eu poderia gastar mais 3 partes de texto para exemplificá-los.

O motivo pelo qual esse texto foi feito, não foi para dizer “ESCUTEM K-POP! ISSO É MUITO BOM!”. A verdadeira intenção foi mostrar que muitas vezes generalizamos e deixamos o preceito de nossos gostos deixarem de lado muitas coisas que poderiam ter uma opinião diferente. Já vi, inclusive, reportagens “erradas” de Estadão, Folha de São Paulo e outros, dizendo que o K-Pop são apenas “garotos e garotas emborrachadas feitos para vender”. Como viram na primeira parte do texto, isso não é verdade. Existe uma preparação e existe um cuidado para o lançamento desses grupos e cantores.

Mas claro que a intenção é vender! Mas isso não quer dizer que por serem de um país “de cultura diferente” das nossas, eles sejam melhores ou piores do que o que temos aqui. Entramos nesse caso na questão do “gosto”, e nisso é algo que não convém ser discutido. Cada um tem o direito de escutar o que quer (contanto que não faça isso dentro do ônibus sem fones de ouvido) e da mesma forma, não tem o direito de interferir no gosto do outro. Da mesma forma que acho absurdo escutar alguns comentários do tipo “Homem não pode gostar de K-Pop”. Seja homem, mulher, gay, lésbica, todos temos o direito de escutarmos aquilo que nos agrada, independente do gênero.

O K-Pop se consolidou como um sucesso. Em 2011, bandas vieram para o Brasil e abriram as portas para mais exibições de outras por aqui, como devem acontecer esse ano. Por mais que alguns digam que são “cópias dos Backstreet Boys”, as boy/girlbands resgataram e de uma forma muito mais lucrativa, o gosto dos fãs por esse gênero. Prova disso é que em 2012 mais grupos estarão chegando ao continente, como o Wonder Girls através de parceria com o canal Nickelodeon, o 2NE1 sendo empresariado pelo Wil.I.Am. do Black Eyed Peas, turnês mundiais de B2ST e BIG BANG e muito mais.

Daqui para frente, o Chuva de Nanquim deve ganhar aos poucos um novo toque “musical”, e espero que entendam que o intuito é apresentar para vocês, um pouco dessa cultura oriental que a cada dia se aproxima mais do nosso mundo. Não estranhem se daqui alguns dias virmos K-Pop ou J-Pop tocando em nossas rádios. Mas estranhem se nossos empresários e investidores não perceberem que o oriente tem muitas coisas interessantes para serem exploradas e exportadas para nosso mundo. É a Coréia, o Japão e a Ásia, aproveitando para exportar aquilo que o mundo ocidental tem deixado cada vez mais de lado: os jovens.

por Dih

Fontes de pesquisa: Luis Nassif Online, BBC Brasil, SarangInGayo

Dih

Criador do Chuva de Nanquim. Paulista, 31 anos, editor de mangás e comics no Brasil e fora dele também. Designer gráfico e apaixonado por futebol e NBA.