Uma história sobre alpinismo pode ser maravilhosa.
Alpinismo talvez seja um dos esportes que eu menos entendo, tanto os termos quanto os apelos de uma pessoa quase perder a vida para subir uma montanha e permanecer no topo até dar a hora de ter que descer tudo de novo. (Isso até gerou uma ótima cena de comédia do Leandro Hassum) E não liguei tanto quando vi o senhor @ojudeuateu comentando de um mangá sobre esse esporte. Oras, se eu achava o esporte chato, muito provavelmente um mangá deveria ser bem chato também, não seria nem um pouco emocionante ver um cara subindo uma montanha.
Então, resolvi fazer o Eu Recomendo #11 sobre esportes alternativos. Na hora de decidir a lista acabou faltando um lugar na e me lembrei de Kokou no Hito. Por que não? Resultado: O post atrasou porque eu não conseguia parar de ler o mangá, sendo que terminei a história em 2 semanas, praticamente anulando minha vida social, mas tudo bem. Mas afinal de contas, o que ele tem de tão bom? O que faz as pessoas se emocionarem e admirarem tanto esse mangá? Descubra agora.
A história
Mori Buntarou prefere ser deixado em paz em seu primeiro dia em um novo colégio, mostrando ser um daqueles rapazes bem anti-sociais. Mesmo assim um colega de classe continua o enchendo e deixando ele cada vez mais irritado. Esse colega de classe o provoca dizendo que nunca mais iria irritá-lo se Mori conseguisse escalar o prédio da escola. Mori aceita o desafio mesmo sabendo que um erro poderia significar a sua morte. Porém durante todo esse trajeto ele acaba sentindo uma série de emoções que vão marcá-lo desde esse primeiro contato até a vida adulta com o alpinismo. Era o começo de uma paixão bem diferente de um amor escolar.
Considerações Técnicas
‘Kokou no Hito’, também conhecido como ‘The Climber’, é um mangá de autoria de 4 diferentes mangakás: Os roteiros são de Nabeda Yoshiro, Nitta Jiro, Takano Hiroshi e Sakamoto Shinichi, sendo esse último também responsável pela arte da série. O mangá foi publicado na revista seinen Weekly Young Jump (da Shueisha) de 2007 até 2012 e rendeu um total de 17 volumes encadernados, com 170 capítulos. Apesar de parecer confuso, os 4 autores conseguem entrar em perfeita harmonia para a criação dessa série, como se houvesse um grande brainstorm para a criação do roteiro da mesma.
Mas começando a falar da história: Pela sinopse apresentada parece ser um tanto genérica e até mesmo clichê, ou quem sabe desinteressante e comum. Sim, no comecinho parece realmente que o mangá vai se tratar apenas sobre aquele velho tema de clube do colegial e um garoto novo aprendendo o significado do esporte em sua vida. É necessário dizer que o ritmo lento dos primeiros volumes pode realmente atrapalhar a leitura do mangá. No mínimo nos 4 primeiros volumes de ‘Kokou no Hito’ a história simplesmente não avança o quanto gostaríamos, sendo somente depois desse ponto que começa a se “encorpar” como deveria. Mas eis o ponto forte: Não pense que essa mudança só acontece nesse inicio. Na verdade o mundo do protagonista sofre reviravoltas até o final da história e mudam até mesmo sua personalidade, compensando o começo morno da história. ‘Kokou no Hito’ não tem momentos de comédia para descontrair e nem ao menos tenta demonstrar isso indiretamente para o leitor. Ele na verdade é muito mais puxado para um drama psicológico. A maior parte do tempo estamos vendo Buntarou escalando alguma montanha, então ficamos mais dentro da mente do personagem, vendo o que ele está pensando e sabendo dos seus sentimentos. O detalhe é como o autor consegue transmitir tudo isso para o “papel”.
A narrativa do mangá não é cansativa e um dos grandes méritos para isso é a arte inacreditável do artista Sakamoto Shinichi. Vocês estão vendo durante o post apenas uma pequena porção de páginas incríveis que você vê durante todos os volumes. Talvez ele possua o melhor traço que eu já vi durante todos esses anos acompanhando mangás, com um número rico de detalhes, de elementos que compõem realmente toda a arte necessária para o desenvolvimento da história. Mas vale salientar que essa arte linda é somente um aperitivo para tudo isso. Ela se mescla com a narrativa, tornando-a muito mais fluida e até mesmo ajuda o leitor a entender o que está acontecendo, mesmo o que o protagonista está sentindo. Muitas vezes vemos Buntarou bem pequeno e uma muralha de gelo e neve a sua volta, deixando com que o leitor pense se é naquele momento que vamos ver o fim do personagem ou pensando em como ele vai conseguir escapar dali. Tudo é pensado em simbologias relacionadas com o passado, o presente e o que espera o protagonista. Cada traço acaba se tornando essencial para o desenvolvimento de tudo isso.
Mas como nem sempre um mangá pode viver só de elogios, existe um ponto a se comentar: Sobre os personagens do mangá, não vou mentir para vocês e dizer que todos que aparecem ali são marcantes ou essenciais para o leitor ou mesmo para a obra. Na verdade o único personagem realmente desenvolvido durante quase todos os volumes é o protagonista Mori Buntarou e só no final que aparece alguém realmente importante (mas não tanto). Buntarou é um cara completamente anti-social, sempre quer fazer tudo sozinho e toda a vida dele é movida para o alpinismo. Os personagens secundários não são tão desenvolvidos pelo autor e acabam ficando de lado após algum tempo. E é uma personagem do final que acaba ocasionando uma das cenas mais marcantes para mim. Obviamente isso não é uma “falha” do autor, pelo contrário. É uma forma narrativa de demonstrar essa exclusão de Buntarou do resto da sociedade. De demonstrar o alpinismo como centro de tudo. É o que definitivamente podemos chamar de artifício de roteiro. Tudo pensado e calculado. Coisa fina.
Comentários Gerais
Kokou no Hito é um mangá extremamente recomendável seja para um fã de esportes ou não. Um mangá totalmente diferente dos que eu já li e que pode enganar muitos por causa do inicio clichê. Não foi fácil começar a gostar do protagonista, mas durante a historia o autor o desenvolve tanto que você acaba começando a compreender os seus motivos e sua solidão. Você acaba criando uma espécie de relação com o mesmo e o mangá se torna mais interessante e mais completo. Nada menos de se esperar de um mangá que merece cada elogio que merece e cada “vibração” ao fim de cada capítulo lido.
Como dito, o mangá possuiu 17 volumes que conseguem passar voando e você durante todo esse tempo pode admirar a belíssima arte do mestre Sakamoto Shinichi. Pare e analise cada quadro, cada página dupla e cada expressão dos personagens. Não vai se arrepender. Não comparando as duas obras, mas é uma pena que ‘Kokou no Hito’ não tenha a repercussão de um ‘Slam Dunk’, por exemplo. Talvez pela demografia, pela revista publicada e por ser uma obra que não é de alcance tão “popular”, o mangá tende a permanecer no nicho, dependendo de cada um de nós indicarmos a leitura para o próximo. Cada segundo vai valer a pena.