Segunda obra da autora resenhada aqui no ChuNan.
Antes de começar a resenha, preciso confessar um detalhe que está entalado há algum tempo: achei que não tinha mais pique para shoujos. Minha empolgação de hoje não se compara com cinco anos atrás, não se compara com a Miyuki que ficava jogada no sofá a madrugada inteira só surtando com os machos, as bitches, as heroínas. Também cheguei a acreditar que pararia com a escrita de vez, mas, como diz uma amiga minha, “escrever liberta”. Ela está certa. Escrever liberta, ler liberta, assistir liberta, viver liberta, e todo esse tempo estive pensando exatamente no oposto, no que me prendia. É sem nexo, mas quero voltar a fazer o que me deixa livre, o que me faz viver e isso é só um pedaço. Só o começo.
A HISTÓRIA
Uma garota que se muda para poder fazer amigos!? Nonoyama Botan é uma garota que passou a vida toda sem amigos devido a diversas situações, mas que decide tentar mais uma vez ao ingressar no ensino médio em um internato. A vida de Nonoyama foi um desastre durante nove anos, mas será que ao se aproximar de Amatou, o garoto que diz não precisar de amigos, sua vida mudará!?
CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS
Publicado entre os anos de 2014 e 2015, Taihen Yoku Dekimashita. é um mangá de Sato Zakuri – autora de Mairunovich – concluído em 5 volumes encadernados. A série foi lançada na revista shoujo Margaret, da editora Shueisha, alcançando uma recepção mediana e ganhando algumas capas da mesma.
Sou uma grande fã da Sato Zakuri como autora. A acompanho faz pouco tempo (acredito que desde 2011) e como leitura assídua das obras da mangaká posso afirmar o quanto a mesma evoluiu nesses últimos anos; alguns aspectos ainda permanecem – temas como bullying ou uma protagonista com problemas para se socializar não são novos – e até mesmo seus personagens – a mocinha mais ingênua e o personagem masculino protetor – são marcas registradas, a essência dos mangás de Sato. Nessa obra em específico, a autora resolve tomar alguns rumos diferentes que, confesso, me surpreenderam. Comparar Mairunovich, sua obra anterior, com essa última é quase um choque. Primeiro pelo traço da história mais recente ter um salto absurdo quando se trata de qualidade e beleza; os desenhos de Sato nunca foram os mais bonitos, nunca chegaram aos pés de suas colegas de trabalho – como, por exemplo, a Yamamori Mika, autora de Hirunaka no Ryuusei, e que também tem seus mangás publicados na revista Margaret –, mas é incrível como agora ela sabe fazer bem uma maior quantidade de cenas que são dignas de printscreens e de virar papel de parede do celular; mesmo na resenha de Mairunovich tive certa dificuldade para escolher imagens para ilustrar o post.
Porém não vim só dar elogios a sensei e sim comentar o modo como ela estruturou a série desta vez: ela saiu de sua zona de conforto justamente por causa do tema escolhido – que apesar de ter sido usado outras vezes, dessa vez foi diferente – ela quis algo novo. Inverteram-se os acontecimentos e, como isso não é matemática, a ordem dos fatores alterou o resultado. Ela ousou. Mas qual foi o preço dessa “ousadia”? O valor que ela pagou foi alto, um desfecho de história um tanto quanto diferente, que obedece ao que lhe foi proposto, mas talvez não tenha atendido as expectativas de seus leitores que estão tão acostumados com os bons clichês usados não só em shoujos como também no gênero romance.
Nonoyama Botan é o segundo tipo de protagonista que mais gosto (as “fortes” vem em primeiro lugar), pois apesar de demonstrar fraqueza, ser absurdamente ingênua e estar sozinha em boa parte do mangá, ela não desiste. Ela tem a total consciência de que não consegue se socializar, de que erra, porém tenta; eu não consigo não admirar essa personagem que luta o mangá todo para conseguir o que mais quer: amigos de verdade. Amatou Haruto, assim como Nonoyama, não se socializa com as pessoas, mas ao contrário da menina, em seu caso é pelo simples fato de não querer amigos. Amatou é um perfeito tsundere que diversas vezes fala para Nonoyama não tentar ser amiga dele, para se afastar, mas que ao mesmo tempo protege a protagonista quando a mesma está em perigo. Essa é uma das características que mais gosto nos personagens masculinos de Sato Zakuri: ela não faz com que eles sejam aqueles personagens desgraçados que fazem a heroína sofrer a história toda, eles são como os personagens masculinos secundários só que sendo os… principais. Faz sentido? Bom, o que quero dizer é que Amatou protege a Nonoyama. Talvez não esteja lá o tempo todo, porém sempre o faz diretamente, sem segredos, sem cobrar nada em troca. E a definição perfeita para ele é um dos pensamentos de Botan: “Ele é como um gato arisco que não quer que ninguém se aproxime. Tão fofinho!”.
Geralmente só descrevo os personagens de que mais gosto ou os que aparecem com frequência no mangá – sejam eles amigos de protagonistas, as bitches ou até aqueles que deveriam ser os principais e não são –, nesse caso, deixei apenas os detalhes de Nonoyama e Amatou, porque até a metade da obra eles são os únicos que realmente permanecem, que estão lá todos os capítulos. É estranho. É nesse aspecto em que a autora troca a ordem dos acontecimentos; ela prefere desenvolver primeiro os dois principais e depois envolver outros personagens que começam a entrar na vida de Botan. Tanto que essa é uma das características que não me agradaram: o casal é fofo, é engraçado e cativa seus leitores, mas são só eles. Há um vazio que só é preenchido para aqueles que não desistem de Taihen Yoku Dekimashita.
Apesar de Taihen ter todo um enredo de drama, ele é uma comédia que se disfarça em seu roteiro. Não aconselho para aqueles que esperam um desenvolvimento sério quanto ao tema “bullying” ou que aguardam todo aquele sermão e a dura realidade em um mangá, pois ele não é assim. Não é esse o foco. Milhares de pessoas passam por maus tratos na infância, adolescência ou na fase adulta, mas ele não está ali para colocar o dedo na ferida e depois jogar sal por cima; ele está ali para entreter e arrancar risadas de seus leitores. Não que a autora não saiba fazer drama – essa mulher sabe, ela samba nesse gênero, inclusive (quase) chorei em algumas partes de Mairunovich, e só não o fiz porque sou coldheart – porém ela opta em dar um ar mais leve desta vez, substituindo a carga emotiva por um misto de romance doki doki e por acontecimentos divertidíssimos – coisas que só shoujos fazem por você™.
Antigamente costumava comparar o humor da Koda Momoko – autora de Heroine Shikkaku e Sensei Kunshu – com a de Sato Zakuri, já que ambas são especialistas em desenhar expressões cômicas em suas personagens. Com essa última leitura, tive que abrir uma “subcategoria” entre as duas mangakás; Momoko puxa seu dom do humor para as caretas bizarras, assustadoras e estranhas – fazendo jus às protagonistas mais “maliciosas” que cria – enquanto Zakuri faz expressões mais simples, mais fofas, que cabem muito bem em suas personagens delicadas e inocentes. O resultado é quase o mesmo – risada atrás de risada –, mas é engraçado como até nesse pequeno detalhe elas tentam realçar ainda mais a personalidade de suas personagens.
COMENTÁRIOS FINAIS
O final deixou um gosto estranho na boca, não ruim, mas também não tão bom, apenas… desconhecido. Acredito que é por isso que mesmo Taihen Yoku Dekimashita não tenha conseguido superar Mairunovich no meu conceito. Vi algo diferente e que não estava esperando. No fim, isso só me faz ficar ainda mais ansiosa para a próxima obra da autora – que inclusive já foi anunciada e virá com o nome de Anagura Amelie –, pois sei que apesar de estar a tantos anos na área, é justamente agora que ela começou a evoluir a ponto de conquistar um público maior.